Eu sou o que te abriga

Domingas Alvim
3 min readNov 10, 2020

Quando a madrugada acordar, deixe que eu seja a sua cama. Com meu corpo, esse travesseiro amassado que te sente os sonhos pelos cabelos, velarei seus sonos. Te enrolarei em meus cobertores e, ao te deslizar pele com pele, sentirei o cheiro do tecido de seus sonhos. Você é o meu. Você é a realidade que eu trilho na sua trilha. Sigo fiel por seus ladrilhos me encaixando em seus mosaicos. E quando esbarro nas suas quinas é que é nos roxos e nas dores que eu despejo amores, esses tetos sem céu. Agora escolha: ou fugir ou me despir pelas unhas. Só quando você me tira a pele é que eu fico quase sem carne de tão nua, ardendo em alma viva, aumentando a minha fogueira na água fervente dos seus gemidos e me afagando nos seus braços. Eu me abafo nos seus gritos abafados de quando tem gente no quarto ao lado. Respeito esses recatos. Você tem timidezes que me convertem em segredo quando eu queria ser estrondo. É que eu tenho umas vaidades que você me faz perder ao me convencer a ser gente quando eu só queria ser bicho. Você me cura rasgando o meu destino nos seus dentes, armadilhas de abismos. Então, não me toque, só me sorva. Porque agora é sempre a hora nesses seus gestos de garras afiadas. Me agarre. Me corte o ar ao me enforcar nesse seu laço de pernas, me amarre dominando, se apossando do pouco que sou e me fazendo comer da sua terra feito um bezerro tomado pelo seu leite. Me faça implorar por seu alimento e por essa falta que você me dá ao sair. E quando for partir, fique! Vamos sentar e conversar até a noite cair no chão de tanto sono. Vamos deixar nossos pensamentos fazerem o amor inconsciente que fazem os olhos que se olham. Vamos emendar nossas coisas e dividir um pedaço de nossos silêncios. Porque você me ajuda a peneirar os sons pra que eu separe as pedras do barulho do pó das melodias. Você me adoça a boca com sua calda de pimenta e me chupa como quem suga o ardente pra dentro, como quem engole o buraco negro que me envolve os sentidos num sudário sujo e santo… Em nossos ossos se engajam movimentos apolíticos e apocalípticos, coisas que te rebelam e te fazem rolar na cara de meus lençóis e me fazem perder as fronhas. Sou tudo na sua falta de jeito. Sou tudo na sua vida. No andar trôpego de sua carruagem, me faça de bengala. Prometo escorar seu peso se você me conceder banhos nas correntes de seus oceanos. Não te contaram? É por isso que você sente frio quando eu não estou. Porque eu agasalho as suas costas comigo. Porque eu sou o seu abrigo. Porque eu sou o que te abriga… dentro de mim.

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